sexta-feira, 10 de junho de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 10

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Victor Silva (Kratos)

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Aprendizado e Treinamento


De onde vem o nome "Parkour"?


Quanto mais meu avô me contava sobre a condição física e as habilidades de meu pai, mais eu fazia perguntas a mim mesmo. Eu me perguntava como ele tinha conseguido fazer todas aquelas coisas. Acabei perguntando diretamente ao meu pai; eu queria saber que tipos de esportes ele tinha praticado para alcançar um nível tão alto. E foi então que eu ouvi a palavra "parcours" pela primeira vez. (Parcours du combattant = Percurso do combatente / Pista de obstáculos). Ele me contou como, enquanto era uma criança soldado, ele levantava todas as noites para sair e treinar, sozinho e às escondidas, na pista de obstáculos, mas também em outros percursos que ele havia inventado por conta própria. Para mim, essa palavra, "parcours", era muito abstrata e não significava coisa alguma. Ele me explicou que havia diferentes percursos - ou parcours - por lá, como percurso de resistência, percurso de agilidade, percurso de resiliência, e assim por diante. Havia até mesmo um percurso de silêncio onde ele treinava com os amigos indo de árvore em árvore na floresta, olhando as tropas francesas de cima, sem ser percebido ou ouvido. As mentes deles já estavam focadas na guerra. Para muitos, hoje, o Parkour é algo divertido; mas para meu pai, era vital - uma questão de vida ou morte. Esse treinamento o ajudou a ficar resistente, a sobreviver na guerra e a se proteger, contra todas as possibilidades. Meu pai era muito paciente, disposto, persistente e dedicado. Ele encarava cada obstáculo que vinha em sua direção e encontrava a melhor maneira de transpô-lo. E ele repetia o movimento cinquenta, cem vezes, até dominá-lo com perfeição. E ele tinha apenas doze, treze anos. Comparado a ele, com a mesma idade, eu me sentia totalmente inferior: se algo acontecia comigo, eu ficava desconcertado e chorava como se tivesse apanhado. Eu ainda estava brincando com meus Playmobils quando ele havia sofrido na selva com a mesma idade. Para meu pai, Parkour era suor, lágrimas e sangue.

Como você foi iniciado no Parkour?


Você precisa entender que o Parkour não surgiu do nada, em um dia. Meu pai nunca me disse, "Aqui, filho. Agora que você já fez quinze anos, eu vou compartilhar um grande segredo com você", não. Eu tive que estudar intensamente, pesquisar, buscar, meio que como um jornalista. Primeiro eu tive que descobrir meu pai e o que estava atrás do homem. Então eu assimilei tudo que ele me ensinou sobre a vida, como lidar com ela, como construí-la com uma base sólida. Ele me deu uma grande quantidade de elementos a respeito de uma certa filosofia de vida, mas também me deu conselhos esportivos para uma melhor preparação física e mental. É uma mistura desses elementos com o trabalho pessoal ao qual eu me submeti por anos que levou ao surgimento do Parkour, pouco a pouco. Algumas pessoas hoje me dizem: "Hey, David, você é o criador do Parkour", mas eu não sou! Não sou um cientista trabalhando em um laboratório, ou um engenheiro; eu não inventei coisa alguma. Veio de um longo processo que começou na minha adolescência - se não antes. Eu não estava mais interessado na escola, e eu precisava de algo mais autêntico, mais real; retornar a algo fundamental. Em certo momento, eu dei um tempo e disse a mim mesmo que a vida é curta, e comecei a olhar para dentro de mim mesmo para descobrir o que eu poderia fazer dela, descobrir em qual área eu poderia me sobressair, e o resto viria depois. Eu herdei isso do meu pai. Ele acreditava que se você aprender certas bases, eles te ajudarão em qualquer outra situação.

terça-feira, 7 de junho de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 9

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Victor Silva (Kratos)

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E você acabou procurando essas raízes na fonte...


Sim, quando eu voltei a viver permanentemente com a minha mãe. Eu tinha catorze anos na época, e ela havia se mudado para Lisses, nos subúrbios de Paris. Foi então que comecei cada vez mais a entrar em contato com meu pai. Eu queria falar com ele, eu queria me movimentar com ele. Eu havia chegado a uma idade em que o corpo requer ação, mas eu não queria simplesmente entrar em mais um esporte e então me arrepender mais tarde na vida. Você pode ter amigos te dizendo: "Vamos jogar basquete ou futebol". Então você vai e começa a gostar, mas sem realmente saber se essa era sua verdadeira vocação. É claro, no começo, eu treinava ginástica e atletismo na escola e em clubes. Eu tinha algumas habilidades físicas, mas nada fantástico. Eu estava aprendendo a usar meu corpo, mas em um ambiente agradável e controlado, em uma sala aquecida, com colchões no chão para proteção. Eu descobri que dar aulas em clubes era muito acadêmico para o meu gosto. E quanto mais eu falava com meu pai, mais eu percebia que eu não precisava de tudo aquilo. Ele me perguntava: "O que você quer fazer da sua vida? Você está treinando porque quer ser um atleta que quer competir, ou você quer fazer algo realmente diferente? Se você quer ser diferente, então treine em uma área que realmente será útil, que te permitirá sair de qualquer situação ou ajudar alguém caso algo aconteça na rua ou em um prédio."

Quanto mais eu falava com ele, mais eu podia ver algo se formando, vindo à vida em minha cabeça. E foi aí que a verdadeira aventura do Parkour começou.

domingo, 5 de junho de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 8

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Leo Silva
Revisor: Victor Silva (Kratos)

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Seu avô o inscreveu em clubes esportivos para canalizar a sua energia?


Meu avô me matriculou na ginástica, mas eu acredito que foi, acima de tudo, para agradar ao meu pai, e também porque ele queria que eu desenvolvesse minhas habilidades físicas para participar de algum esquadrão de bombeiros mais tarde. Eu pessoalmente não tinha uma preferência; tudo o que eu queria era praticar esportes. Meu avô nunca me forçou a nada. Eu fazia ginástica e também atletismo na escola. Eu era muito aplicado; era talentoso em comparação com os outros, mas para mim não havia muita diferença. Não era por que eu podia dar um mortal ou um pulo grande que eu me sentia mais forte ou resistente. Eu ainda era muito introvertido, muito retraído. Eu não tinha nenhum tipo de identidade na escola ou fora dela. Eu não sabia quem eu era em meio aos outros por que eu não me afirmava. Eu sempre fui muito reservado e não falava muito com meus colegas de classe. Nas aulas eu não respondia às perguntas dos professores e não ia ao quadro negro mesmo quando eu sabia as matérias de cor. Simplesmente porque não queria que minha voz fosse ouvida. Preferia fingir não saber nada a me expressar. Na minha cabeça, sentia que havia vencido quando o professor acabava perguntando para algum outro aluno. Mas na verdade estava apenas fracassando na escola.

Houve um tempo em que eu questionava tudo que me estava sendo ensinado na escola. Não queria que nenhuma informação entrasse na minha cabeça sem ter certeza de que era verdadeira. Se me diziam que Luís XVI viveu e morreu de certa forma, eu questionava isso e ficava me perguntando: “Mas como eles sabem? Eles não estavam lá para testemunhar isso!” Os professores não eram confiáveis para mim. Eles só me diziam coisas que eles mesmo haviam aprendido em livros. Eu sempre tive essa dúvida na minha cabeça, e por consequência eu não queria aprender. Exceto pelas coisas básicas como “dois e dois são quatro”, nada entrava em minha cabeça dura e eu simplesmente não aprendia minhas lições. Não porque eu não conseguia, mas por que não conseguia ver nenhuma boa razão para fazê-lo. Eu não via o porquê de aprender tudo aquilo, qual era o objetivo de tudo no fim de contas. Eu acho que se hoje nós explicássemos às crianças por que tal e tal coisa serão úteis na vida delas, elas seriam menos relutantes em aprender na escola. Ao invés de me dizerem o motivo para eu decorar a vida e os fatos de essa ou aquela figura histórica importante, o professor apenas dizia: “Decore isso para amanhã”. Como resultado, eu não estava nem um pouco interessado, e os professores achavam que eu era um fracasso. E eu, eu não podia nem mesmo soletrar sem cometer dez erros em uma frase e isso me desencorajava.

Seus problemas na escola preocupavam seus pais?


Minha mãe provavelmente ficava preocupada porque seu irmão era um diretor de escola, sua cunhada era professora e, claro, seus sobrinhos eram os melhores de suas salas. E eu era exatamente o oposto. Então havia certa pressão tanto em minha mãe quanto em mim. Se eu ouvisse meus parentes, às vezes me perguntava o que eu faria da minha vida. Algumas pessoas na minha família pensavam que eu não tinha futuro algum só porque eu não conseguia jogar jogos de tabuleiro! Todos esses comentários estúpidos realmente me chateavam e acabei pensando que eu realmente era um nada, e me retraí ainda mais. Quando me tornei um adolescente, comecei a me perguntar bastante sobre a vida em geral. Eu me perguntava o que eu estava fazendo aqui, nesta vida. Eu sentia como se tivesse nascido em uma época em que nada acontecia e que portanto eu não experimentaria aquelas aventuras empolgantes que meu avô havia conhecido na Segunda Guerra Mundial, ou meu pai conhecido na Guerra do Vietnã. Desde pequeno, eu fui criado ouvindo histórias de bombeiros, soldados, heróis e feitos de todos os tipos, e é claro que isso entrava na minha cabeça e me influenciava. Na época, eu vivia em Vendée com meu avô e comecei a falar muito sobre o meu pai. Eu fazia várias perguntas sobre o passado dele, suas missões no esquadrão de bombeiros de Paris. Eu precisava saber de onde eu vinha, saber mais sobre minhas raízes asiáticas do lado do meu pai, mesmo que elas não fossem visíveis em minhas características físicas. Eu estava trabalhando a minha mente e, para meus primos do lado da minha mãe na família, eu dizia e repetia que eu não era como eles.

sábado, 21 de maio de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 7

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: André Sanches (Sony)
Revisor: Victor Silva (Kratos)

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Por que você foi criado pelo seu avô e não pelos seus pais?


Meus pais não viviam juntos. Eles provavelmente pensaram que a melhor escolha fosse eu ser criado pelo meu avô. Meu pai não era exatamente um pai nato e, já que ele cresceu sem seus próprios pais e tinha conseguido muito bem viver por conta própria, ele provavelmente pensou que isso seria uma coisa boa para mim também. Acredito que, para ele, o melhor modelo para seu filho seria o patriarca da família. E desde que meu avô se tornou viúvo e passou a viver sozinho, eu era uma espécie de presente para ele, para que ele pudesse cuidar de mim e para que eu pudesse estar sob sua proteção. Eu, pessoalmente, não tenho arrependimentos sobre essa decisão deles e nem sobre a minha infância. Eu via minha mãe nos fins de semana e eu sentia falta dela, mas meu avô estava tão envolvido em minha educação e ele estava cuidando tanto de mim que eu nunca senti falta de carinho. Ele tinha pequenos hábitos de um homem velho, mas ele sempre respeitou muito o meu mundo. Por exemplo, se eu quisesse praticar um esporte, ele me matricularia em um clube; e se eu quisesse trocar, ele me deixaria fazê-lo. Ele cuidou de mim verdadeiramente e falava muito comigo. Eu me sentia mais bem cuidado do que os meus colegas de escola que viviam com ambos os pais. Além disso eu sempre mantive contato com meu pai, mesmo que eu estivesse vivendo com meu avô no início e depois com a minha mãe. Ele vinha me visitar nos fins de semana, ou eu ia para a casa dele. Tenho a sensação de que ele queria ficar longe de mim para que eu tivesse que procurá-lo, aprender a conhecê-lo, aprender as coisas sozinho, sem que ele forçasse ou impusesse nada a mim. E isso é exatamente o que aconteceu mais tarde, durante a minha adolescência.

Você tinha habilidades físicas específicas quando criança? Você era destemido?


Na verdade, eu era um tanto tímido, reservado e retraído. Mas às vezes, eu podia ser ousado! Meu avô e eu estávamos vivendo em algum tipo de grande mansão em Fécamp, que compartilhávamos com outra família. A entrada tinha a forma de um pagode com enormes pilares e um telhado chinês. Esta mansão dava vista para a cidade e eu me sentia meio distante nesse lugar impressionante. Nem mesmo meus amigos me visitavam muito porque eles se sentiam muito impressionados. Até mesmo eu tinha medo à noite, e esperava meu avô para ir para a cama antes que eu pudesse adormecer. Minha imaginação podia correr solta neste lugar e eu me sentia como em um castelo de contos de fadas. Então eu fazia coisas loucas, como escalar as bordas das janelas, me pendurar na sacada ou subir no telhado de uma pequena cabana no quintal. Meu avô costumava colocar arame farpado em todas as janelas para me impedir de ir a lugares perigosos do lado de fora. Ele ficava me dizendo o tempo todo para parar de escalar e de saltar. Ele não queria me assustar; ele apenas não queria que eu me machucasse. Ele tinha um problema no quadril como consequência de uma má aterrissagem após um salto, e ele não queria que eu me tornasse deficiente do jeito que ele era. E era a mesma coisa fora da mansão: cada vez que eu via uma rocha ou uma árvore, eu tinha que escalá-la. Lembro-me de que havia um aterro na praia em Fécamp, onde eu ia o tempo todo e saltava mesmo que a altura fosse bastante impressionante para um garoto da minha idade. Eu não sei exatamente por que eu estava fazendo aquilo, mas algo estava me puxando, me atraindo.

segunda-feira, 28 de março de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 6

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Victor Silva (Kratos)

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O início


Tendo crescido com um pai cuja trajetória de vida foi tão extraordinária, você o admirava e teve vontade de ser como ele?


Na verdade, a primeira pessoa que admirei e tive como um modelo foi meu avô materno. Ele me criou desde meu nascimento, em abril de 1973, até meus catorze anos. Eu passei os primeiros dias da minha vida na casa dele em Fécamp, Normandia, e após uma pequena separação com a minha mãe em Boulogne-Billancourt (próximo a Paris), eu voltei a viver com ele por mais três anos em Vendée. Meu avô era viúvo e ele realmente cuidou muito bem de mim. Ele era um ex-bombeiro do pelotão de Paris - como meu pai. Ele trabalhou lá por trinta e dois anos. Ele também era um veterano da Segunda Guerra Mundial. Ele se tornou um viúvo quando ainda era bem jovem mas nunca se casou novamente. Ele tinha relacionamentos e casos, mas ninguém nunca sabia o que realmente estava acontecendo. Eu, pessoalmente, nunca vi nada, e eu vivia na casa dele. Talvez quando ele saía para uma caminhada ele na verdade estava indo ver uma namorada, mas ele nunca disse nada a ninguém. Eu acho que ele não queria impor uma madrasta aos filhos dele. Ele respeitava a eles, e igualmente a mim, ao ponto de não aparecer com uma mulher em casa. Ele era um homem muito quieto e discreto, e também tinha um auto-controle impressionante. Por exemplo: sempre havia um maço de cigarros em casa, mas ele fumava apenas um cigarro no domingo, após o almoço.

Eu respeitava como ele seguia a vida e como ele havia superado as dificuldades, e eu o admirava por isso. Ele realmente foi meu primeiro modelo de vida. Ele era um homem direto, muito honesto em sua vida pessoal e respeitado em seu trabalho. Meu avô nunca brigou com outro homem e não aprendeu arte marcial alguma. Ele era o oposto total do meu pai, que havia aprendido a lutar até a morte. Ele estava me ensinando um outro modo de vida. Ele nunca teve as habilidades que meu pai tinha, e nem o espírito. Para meu pai, o mundo externo era uma selva onde você tinha constantemente que ter cuidado e se proteger, ao passo que meu avô era mais sereno nos seus relacionamentos com o mundo. Isso equilibrou totalmente a minha educação. Sem meu avô, eu provavelmente teria caído em padrões excessivos, como meu pai. Eu me vejo equilibrado entre esses dois homens. Uma mistura de sabedoria e audácia, de respeito e rebeldia, de freio e ação. Tanto meu avô quanto meu pai são os pilares da minha vida. Eles me transformaram em quem eu sou hoje.

Como era a vida com seu avô?


Posso dizer que fui criado com certa disciplina. Meu avô me ensinou os grandes princípios da vida, as fundações de como se comportar na sociedade. Graças à sua experiência nos bombeiros, ele me mostrou por que é importante ter um estilo de vida saudável e um lar bem cuidado. Ele me contou de vezes em que foi chamado aos lares das pessoas e se viu em lugares muito modestos onde tudo era arrumado e limpo e, ao contrário, vezes em que se encontrou em apartamentos ricos onde tudo era bagunçado e sujo. Ele costumava me dizer: "Se qualquer coisa acontecer com você, se as pessoas tiverem que ir ao seu lar, você deve se certificar de que tudo está arrumado e limpo." Ele me ensinou a ser educado, a respeitar os outros e a dizer a verdade. "Você tem uma boca, use-a para falar. E ao invés de dizer besteiras, apenas diga a verdade ou coisas úteis, coisas que podem ensinar algo, que podem trazer algo aos outros." Ele também me impeliu a usar meu corpo e minhas habilidades físicas para fazer coisas úteis, provavelmente esperando que eu me tornasse um bombeiro também. Ele repetia: "Se você tiver que usar sua força física, faça-o por boas razões; ao invés de roubar uma casa, use essa energia para ajudar as pessoas." Graças a ele, eu entendi que sempre temos uma escolha na vida, uma escolha que pode te levar ao caminho certo ou ao caminho errado. "Com uma faca, você pode escolher se tornar um serial killer ou um escultor."

sexta-feira, 11 de março de 2016

Palavras e ações: Uma filosofia do Parkour

Tradução livre do artigo Words and Actions: A Parkour philosophy, de Stephane Vigroux
Traduzido por: Victor Silva (Kratos)


Algo que aprendi bem cedo quando eu comecei minha jornada no Parkour foi pensar duas vezes antes de abrir minha boca. Antes, durante e após os treinos. Tudo podia ser desafiado e testado na hora. Além de serem verdadeiras feras quando em ação, os veteranos do Parkour com quem eu treinei também eram muito cautelosos ao usar as palavras para falar de algum salto ou desafio.

Primeiramente, não há nada fácil demais. Respeite o salto. Respeite o obstáculo e o processo de superá-lo. Sempre. Eu fui pego raras vezes por David (NdT: Belle), após conquistar um salto ou obter sucesso em um desafio, dizendo: "isso foi fácil!". Ele instantaneamente me repreendia e me explicava que não é porque eu consegui realizar o salto que ele era fácil. Isso era arrogante e desrespeitoso para com o salto. Para ele, a relação e a conexão que ele criava com um obstáculo eram baseadas em respeito e valorização. Na maioria das vezes, é preciso bastante tempo e trabalho duro para conseguir realizar um salto, esse processo é feito de esforço e dor e não deveria ser retirado instantaneamente com um "foi fácil" imediatamente após o salto. Não era fácil até o último segundo antes de ser realizado.

Além disso, dizer que é fácil é para preguiçosos. Se eu dissesse que algo era fácil, instantaneamente eu me perguntava se eu poderia fazer quando cansado, em tempo chuvoso, na neve, à noite no escuro, sem aquecero corpo, com os olhos fechados, etc. E novamente eu tinha que ser cauteloso com a minha resposta, porque ela seria posta à prova imediatamente, todas as vezes. Mesmo que algo fique mais fácil, sempre há espaço para aperfeiçoamento e melhoria. Dizer que é fácil faz com que você pare de dificultar as coisas e lhe dá uma satisfação superficial.

Outra coisa com a qual eu me tornei atento foi fazer afirmações sobre os saltos ou desafios que eu pensava que podia fazer. Eu me lembro que uma vez à noite, após um treino, estávamos relaxando na casa de Romain Moutault (um dos traceurs do grupo de Lisses) quando começamos a falar sobre algumas coisas e sobre movimentos que pensávamos que conseguiríamos fazer em condições difíceis. Sendo o criador de problemas e sempre indo pelo caminho mais difícil e complicado, David com frequência me perguntava o que eu pensava de um salto ou um movimento. Mas quando você o conhece, você sabe que para ele há apenas UMA coisa que importa. "Você pode fazer aqui, agora?" Ele estava tentando ver se eu era sensato com minhas respostas, tentando achar o ponto fraco. Em certo ponto, ele mencionou um salto na Universidade de Evry e perguntou se eu poderia fazê-lo à noite. Eu pensei cuidadosamente e disse que sim. Com um sorriso no rosto, a resposta dele foi: "Ok! Vamos fazê-lo então!". De uma conversa relaxada em um quarto aconchegante, agora estamos na minha van, dirigindo para Evry.

A regra era simples: assim que eu saísse do carro eu tinha que ir direto para o salto e, sem aquecimento, no escuro, realizá-lo na primeira tentativa. Enquanto eu dirigia, eu tentava visualizar o salto e me aquecer internamente.

Aqui estou, encarando o salto, David olhando para mim e contando: 3, 2, 1... PULE. E eu pulei, errei a distância, aterrisei muito nos calcanhares e escorreguei, caí do muro e acabei com meu traseiro no chão. Eu fiquei tão irritado com a situação e comigo mesmo. Eu estava fisicamente bem, apenas com um arranhão no traseiro, mas realmente desapontado ao encarar a dura realidade naquela noite. David não teve que falar muito mais, eu tinha aprendido a minha lição.

Esse foi um de muitos exemplos, mas o princípio continuou o mesmo. 1. A não ser que você esteja 100% seguro de que consegue fazer alguma coisa, não fale que consegue. 2. Não existe nada fácil. Existem coisas para as quais você treina pesado e acaba ficando melhor. E essa situação de "melhor" pode ser indefinidamente dificultada até o ponto em que você não consiga mais fazer tal coisa. O jogo não tem fim e você nunca é um mestre.

Eu ouvi muitas vezes "Isso é fácil" e "Eu consigo fazer isso", sem nenhuma pista sobre o significado mais profundo dessas palavras. Ações falam mais alto do que palavras, e o Parkour é um mundo onde isso é muito real. Muitas pessoas comparam o Parkour com as artes marciais em algumas formas. Eu acho que se há similaridades, uma delas seria o código de ética e atitude. A filosofia e a mentalidade do Parkour começam com esses tipos de princípios em mente o tempo todo. Permaneça humilde, procure pela dura realidade, pois o resto é apenas ilusão.

Stephane Vigroux

quarta-feira, 9 de março de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 5

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Leo Silva
Revisor: Victor Silva (Kratos)

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Retornando à França, seu pai tentou entrar em contato com família dele, voltar pro Vietnã?


Quando ele estava na escola em Dalat, dois ou três de seus irmãos vieram visitá-lo. Disseram que seu pai havia sido assassinado. Então ele se viu órfão. E o que houve com seu pai fez com que ele se tornasse ainda mais duro e fechado. Ao chegar à França foi posto em uma família adotiva, porém permaneceu solitário. Após alguns anos, ele foi capaz de entrar em contato novamente com alguns membros de sua família que também se refugiaram na França. Alguns primos lhe disseram que sua mãe e irmãos também haviam sido trazidos à França. Ele viu a mãe dele novamente cinco ou seis vezes, mas os sentimentos já não eram os mesmos. Em Dalat, ele conviveu com crianças que haviam perdido os dois pais, e com isso aprendeu a se desprender de todos os laços de família, assim como elas haviam feito. Era como se todos os sentimentos e emoções fossem apagados para transformá-los em pequenos soldados. Ele se via completamente afastado de sua família, especialmente sua mãe, com quem nunca teve um bom relacionamento. Por alguma razão parecia que ela nunca havia gostado dele quando criança. Ele se lembra de ser deixado de lado pelo resto da família. Sentia como se sua mãe o considerasse amaldiçoado por ser o sexto ou sétimo filho a nascer, e em algumas tradições vietnamitas crianças que nasciam nessas condições eram consideradas mau agouro. Meu pai me falou muito sobre sua mãe e sua infância, e ele se lembrava de muitos detalhes. Por exemplo, ele me contou que moravam perto da selva e que, vez ou outra, tigres apareciam próximos à vila. Alguns até entravam nas casas. Ele raramente comentava sobre voltar ao Vietnã. Porém no fim de sua vida, ele falou um pouco mais sobre isso; eu queria poder ter dado essa viagem a ele antes de ele partir; eu queria ter conseguido o dinheiro para isso. Mas ele partiu na véspera do ano novo de 1999, antes que eu conseguisse...

quinta-feira, 3 de março de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 4

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Leo Silva
Revisor: Victor Silva (Kratos)

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As habilidades físicas dele eram herança de família?


De maneira alguma. Isso não tinha nada a ver com família dele. O pai dele não era um atleta, nem a mãe. Meu pai trabalhou pesado para desenvolver suas habilidades físicas. E quando digo trabalhou duro, era pra valer. Ele começou a treinar feito um maníaco quando ele caiu em um orfanato. Durante a noite, enquanto as outras crianças iam dormir, ele saia da cama pra correr na floresta, subir em árvores, saltar, fazer flexões, se equilibrar. Ele nunca parava, repetia os movimentos vinte, trinta, cinquenta vezes. Ele socava árvores com os punhos nus para torná-los mais fortes e resistentes, batia com sacos de pancada em suas bochechas e nariz para torná-los mais firmes e menos sensíveis à dor. Quando me contava suas histórias de infância, eu não conseguia compreender por que ele passou por esse treinamento tão insano, por que ele infligia tanta dor a si mesmo. Então, um dia ele me contou que havia sofrido abusos enquanto esteve na casa do seu tio... Ao contrário da maioria das crianças, ao invés de se fechar, ele se impulsionou para frente para construir um casco forte. Em algum ponto, sozinho no orfanato, algo despertou em sua mente e ele disse a si mesmo: "de agora em diante, ninguém mais tocará em mim! Chega!" Quando ele descreveu aquele momento para mim, eu entendi: eu nunca havia ouvido alguém dizer aquilo com tanta força como ele disse. Aquele "Chega!" significava muito. Ele havia passado por muito sofrimento e, pelo resto da sua vida, decidiu que nunca seria uma vítima, nunca mais.

Então ele literalmente mudou, tanto mental quanto fisicamente?


Absolutamente. Foi com um trabalho físico completo juntamente com uma força mental extraordinária. Mesmo aos sessenta anos de idade, meu pai continuava a correr e realizar saltos inacreditáveis. Eu o via carregar pesos incríveis. Ele treinava arremesso de facas e lâminas em alvos e seus movimentos eram sempre perfeitos. Junto com meus amigos - sete ou oito adolescentes -, nós nos reuníamos para tentar derrubá-lo no chão, mas ele não se movia nem um centímetro, continuava lá tranqüilo, com suas mãos nos bolsos, usando seus chinelos! Sua força física era fenomenal e ele sempre mantinha um sorriso no rosto, nunca mostrava o menor sinal de dor ou de esforço. Eu podia apenas acreditar em tudo o que ele me contou sobre sua vida e suas experiências. Além disso, ele nunca se gabou e também me contou a respeito do seu lado sombrio, suas fraquezas, seus erros. Ele não fingia ser o pai perfeito na frente de seu filho. Nunca me disse que era o melhor ou o mais forte. Nunca.

Falando sobre o que ele havia passado em sua juventude, ele me contou uma história que me impressionou profundamente. Enquanto estava sendo transportado de volta à França, ele sofreu de uma hérnia testicular, que infeccionou. Ele teve que passar por uma cirurgia bem ali, em alto mar, em um barco cheio de refugiados. Não lhe deram nenhum anestésico - apenas um pedaço de madeira para morder. Eles o abriram e cortaram. Eu acho que isso o afetou profundamente, tanto fisicamente quanto psicologicamente, sabendo as conseqüências de tal remoção para um homem. Ele tinha 16 anos naquela época e deve ter se perguntado se algum dia chegaria a ter filhos ou mesmo se iria sobreviver. Sua força também veio dessa situação. Ele foi fisicamente diminuído, mas ele queria mostrar que isso não o impediria de viver a vida ao máximo, de ser mais forte que os outros e de seguir seu próprio caminho. Ele era respeitoso com seus superiores, na hierarquia militar, mas se acreditasse que algo estava errado, se opunha e era teimoso e inabalável feito uma parede. Quando começou no pelotão de bombeiros, seu superior o fez limpar banheiros. Ele obedeceu para mostrar a seu chefe que o respeitava, mas também o fez entender que jamais o faria novamente. Sem violência - apenas palavras e confiança... Meu pai tinha um espírito livre, e queria que sua liberdade fosse respeitada. Às vezes isso produzia efeitos negativos. Como a maioria das ex-crianças soldados, ele tinha problemas para se adaptar, impulsos que ele teve que aprender a controlar. Eu via nele um homem lutando contra seus próprios instintos, por toda a vida. Em algum ponto ele aceitou ser parte do sistema, mas às vezes o seu rebelde interior vinha à tona. Por exemplo, ele se negava a pagar impostos. Para ele aquele era seu dinheiro, um dinheiro ganho com trabalho duro, e ele não via por que deveria entregá-lo de volta ao governo. Comparado a outros pais, o meu realmente parecia não pertencer a esse mundo.

segunda-feira, 29 de fevereiro de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 3

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: André Sanches (Sony)
Revisor: Victor Silva (Kratos)

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Meu pai, o herói


A fundação do parkour vem do seu pai e da trajetória de vida extraordinária dele. É preciso cavar fundo nela para encontrar as raízes do que ele passou para você, tanto como um pai quanto como um homem. Pode nos dizer quem era Raymond Belle?


Meu pai nasceu em 1939 em Hué, Vietnã, de um casal misto. O pai dele era um médico francês do exército colonial e a mãe dele era vietnamita. Ele veio de uma família numerosa - ele tinha cerca de dez irmãos. Eles viviam bem, em uma bela casa, eram donos de cavalos. Mas o conflito pela independência do Vietnã se transformou em uma guerra, e sua infância virou um pesadelo. Enquanto ele estava em férias na casa de um tio, ele encontrou-se afastado de sua família por uma linha de frente que dividiu o país em duas partes. Ele não podia voltar para seus pais e tinha que ficar nesta família, onde ele passou por momentos difíceis. Depois de um tempo, o tio que não queria cuidar mais dele o colocou em uma escola militar perto de Dalat, conduzida pelos franceses. Meu pai tinha sete anos na época. Foi um verdadeiro choque para ele. Ele não tinha pedido nada daquilo e se viu, da noite para o dia, em um acampamento para órfãos. Não era o que ele tinha sido criado para esperar: ele veio de uma família rica e de repente encontrou-se em uma vida miserável, a anos-luz do que ele tinha conhecido até então; uma escola militar onde você tinha que lutar para ganhar respeito, onde sua mãe não estava mais ali para te confortar. Em Dalat, era correr ou morrer - a sobrevivência do mais apto. A guerra da Indochina (pré-guerra do Vietnã) estava no auge e aqueles orfãos eram treinados para se tornarem soldados. Eles aprendiam técnicas de luta, longas caminhadas nas montanhas, montagem e desmontagem de armas no escuro... Tudo o que eu aprendi quando estive no exército, com dezenove anos. Mas ele teve que fazer quando criança, ele não teve escolha. Para sobreviver, ele rapidamente entendeu que não podia confiar em ninguém além de si mesmo e que tinha que se tornar o melhor lutador.

Quanto tempo ele ficou nessa "escola"?


Ele ficou lá por nove anos. Após a derrota de Dien Bien Phu, em 1954, ele foi enviado de volta para a França num barco. Ele encontrou-se em um acampamento com outros refugiados na região de Lyon. O exército francês cuidou dele e de sua educação militar até 1958. Um ex-residente de Dalat, que tinha ficado impressionado com as capacidades físicas dele, sugeriu que ele se juntasse ao prestigioso Pelotão de Bombeiros de Paris. Isso foi provavelmente o melhor conselho que ele recebeu. De repente, tendo sido treinado para lutar e matar, meu pai encontrou-se salvando vidas. Não era originalmente sua vocação e ele teve que se adaptar, mas ele se destacou ao fazê-lo. Isso deu um sentido para todo o seu treinamento na selva vietnamita. Ele colocou seu coração e sua alma nisso. Ele sempre era  voluntário para missões perigosas. Se houvesse um telhado ou uma sacada para subir, ele iria. Seu senso de coragem, auto-controle e auto-sacrifício eram impressionantes: ele poderia dar a vida para salvar a de outra pessoa. Seus companheiros do pelotão o apelidaram de Kamikaze, mas esse não é o nome que eu daria a ele, pois tal nome transmite um sentimento imprudente e auto-destrutivo, ao passo que ele não estava pronto para se lançar em qualquer situação que aparecesse. Ele era apenas o primeiro a ir, antes dos outros. Enquanto seus colegas bombeiros ainda estavam em seus medos, hesitantes, ele iria porque ele já havia avaliado perigo e pesado os riscos em sua mente. Ao longo de sua carreira, meu pai colecionou resgates difíceis que lhe renderam diversos prêmios e medalhas. Seus chefes sabiam que podiam sempre contar com ele. Um dia, quando ele estava de folga, ele foi chamado para uma missão perigosa: retirar uma bandeira da torre da catedral de Notre Dame, colocada lá por manifestantes. Ironicamente, era uma bandeira vietcongue. Ele me mostrou artigos de jornais sobre essa missão, que remonta a 1969, nos quais ele está no céu, pendurado em um cabo sob um helicóptero, se aproximando de Notre Dame. Ao ler o artigo, eu estava me perguntando por ele e não outro bombeiro? Então compreendi que ele tinha esse algo a mais, e esse algo era confiança. Ele tinha uma auto-confiança total. Quando ele dizia que poderia fazer alguma coisa, as pessoas acreditavam nele. Ele sempre teve essa auto-confiança em todas as áreas da sua vida. Depois de deixar o pelotão de bombeiros em 1975, ele trabalhou para empresas privadas e foi responsável pela segurança de grandes edifícios parisienses, como a Torre de Montparnasse. E a cada vez, seus empregadores ficavam impressionados com a sua eficiência. Quando ele estava no comando, tudo se desenrolava suavemente. Ao longo de sua carreira, ele também se destacou por seus feitos atléticos. Ele foi parte da equipe de treinadores de ginástica dos Bombeiros de Paris, fazendo demonstrações para bombeiros jovens ou ao público. Ele também foi várias vezes o campeão militar nacional no salto em altura e no salto em distância.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

Mova-se como um ser humano: Por que você não deveria "fazer exercício"

Tradução livre do artigo Move Like a Human: Why You Shouldn’t Exercise, de Dan Edwardes da Parkour Generations
Traduzido por: Victor Silva (Kratos)


Você está pronto para isso?

Você precisa parar de fazer exercícios. Em vez disso, você precisa começar a se movimentar.


O que eu quero dizer com isso? Bem, quando pensamos em exercícios, nós tipicamente imaginamos repetições, de alta frequência e pouca variedade, de padrões de movimentos consecutivos e limitados. Você vai à academia ou à quadra de esportes ou à pista de corrida 3-5 vezes  por semana por 30-60 minutos, fica muito suado e sem fôlego repetindo uma rotina de movimentos altamente previsível que pode ou não seguir as funções naturais do corpo humano. Até mesmo os paradigmas de 'treinamento funcional', que agora permeiam a indústria fitness, na realidade estão apenas encontrando padrões novos para colocar no lugar dos velhos - kettlebells no lugar de halteres, pull ups em argolas no lugar de pull ups em barras fixas - , e acabam produzindo os mesmos resultados: atletas com tecidos especificamente fortalecidos junto com tecidos subdesenvolvidos, levando a cargas não saudáveis, deformações e lesões.



Nossos corpos não foram feitos para isso. Esse modo de se mover - explosões curtas e intensas de variedade limitada, cercadas de horas de inatividade e um modo de vida sedentário - é um fenômeno muito recente na evolução humana. Talvez tenha alguns poucos séculos, no máximo. Não é a finalidade do corpo, não nos alimenta fisica ou mentalmente, e os resultados são evidentes na debilitação física geral e na falta de habilidades de movimentação do ser humano moderno. O treinamento fitness ou é cumprido para propósitos estéticos - queimar gordura e construir físicos musculares - ou para suplementar práticas esportivas específicas que têm baixas demandas em termos de complexidade e adaptabilidade de movimentos. Olhe, por exemplo, a definição atual de agilidade - "trocar de direção em alta velocidade" - e me diga se ela não apareceu como resultado de esportistas competidores que precisam se esquivar de seus oponentes. Mas se essa é a sua definição de agilidade, você nunca viu como um macaco se move, ou um leopardo. Ou, de fato, uma criança brincando.

Nossa movimentação deve ser muito mais: altamente variada, constantemenete em mudança e em adaptação, trabalhando com alinhamentos e demandas estranhas, desafiando a mente tanto quanto o corpo... E isso é o que leva à saúde: não ao fitness, não às forças especializadas, não a um colapso físico gradual - à saúde. Um conceito bem diferente.

Exercício é uma parte da movimentação, só isso. É uma parte útil, às vezes, e pode ser divertida, desafiadora, recompensadora, e construir uma comunidade. Mas é apenas isso: uma parte. Limitar seu conceito de movimentação a qualquer que seja sua forma de exercício é limitar seu potencial àquela forma bem restrita de movimento.

A toda hora nos perguntam porque atletas praticantes de Parkour são tão habilidosos, tão fortes e ágeis e tão capazes de uma forma geral. A resposta não está em nenhuma técnica mágica ou método de treinamento. Na verdade, a resposta é encontrada na ausência de um único método de treinamento. É porque praticantes de Parkour se movem completamente, propriamente e holisticamente, e tipicamente eles fazem isso durante uma boa quantidade de tempo todos os dias. A brincadeira deles se tornou sua disciplina. Eles seguiram sua real natureza.



Além disso, eles deixaram a movimentação "vazar" para todos os momentos do dia - brincando com a arquitetura que encontram enquanto caminham, experimentando novos movimentos enquanto relaxam no parque, e até mesmo andando muito mais para explorar o ambiente e encontrar bons pontos de treino. Parkour é uma verdadeira cultura de movimento, uma das poucas encontradas nas modernas sociedades industrializadas.

A chave para desenvolver igualmente todas as partes do seu corpo, e assim ser holisticamente saudável, é usar seu corpo de forma igual e como um todo. Apenas correr, não - antinatural. Apenas levantar pesos, não - antinatural. Apenas escalar, apenas rastejar, apenas pular, apenas jogar squash - não, não, não e não. Sozinha, qualquer uma dessas formas de movimentação promoverá um desenvolvimento antinatural e não saudável. Mas misture tudo, combine todos esses movimentos e coloque o corpo em padrões de movimentação holísticos que requerem constante adaptação e variação, e você se aproximará mais da forma como desenvolvemos essa forma física incrivelmente capaz.

Mas também é um erro isolar esses componentes de movimentação natural e pensar que isso será efetivo: combinações de técnicas separadas praticadas consecutivamente mas ainda isoladamente. Isso é perder o ponto inteiramente - pensar que se pode desconstruir a necessidade dos nossos corpos por padrões de movimentos variáveis e complexos, e substituir isso por subconjuntos treináveis - como, por exemplo, se equilibrar em pedaço de madeira por 30 minutos, ou ficar executando apenas um movimento repetidamente.

O segredo é aplicar esses componentes como partes de um todo. Movimento é mais do que a soma das suas partes. O Parkour produz humanos que parecem super capazes simplesmente porque todo seu paradigma de treino, desde o primeiro dia, são desafios de movimentação que não são excessivamente desconstruídos ou dividos em componentes. O cérebro, o sistema nervoso, os tecidos, tudo é testado igualmente e todo o sistema tem que trabalhar em uníssono. Fluindo.

Eu acho que isso é empírico, e não teórico. De longe, o grupo de humanos mais competente e adaptativo que eu encontrei é a comunidade do Parkour. Eles são generalistas especialistas. Não tão especializados como outros esportes e exercícios - saltadores de distância pulam mais longe, levantadores de peso conseguem mover mais peso, corredores de velocidade conseguem cobrir 100 metros mais rapidamente -, mas praticantes de Parkour são mais capazes, de uma forma geral, e têm um patamar mais alto de fisicalidade, movimentação natural e integração corpo-mente do que qualquer outra subcultura atlética que eu já encontrei.

Quer uma prova? Visite o YouTube e veja a variedade, a complexidade e a escala de movimentos que praticantes de Parkour fazem regularmente, e fazem por diversão e com facilidade. Então, tenha em mente que a vasta maioria desses indivíduos nunca seguiu uma abordagem programada e padronizada de exercícios, nunca calculou sua carga máxima de repetição única (1RM), e nem fez treinamento de ginástica - eles são produtos de constantes desafios cada vez mais difícieis de movimentação adaptativa nos seus terrenos naturais, sejam eles rurais ou urbanos. Eles podem se adaptar a quase qualquer outro paradigma com razoável facilidade, são experts em administrar risco e medo, e seu treinamento traz a eles um profundo prazer e crescimento em todos os sentidos. Eles não começaram desse jeito, eles desenvolveram essas habilidades e atributos com o tempo. Eles não são super-humanos ou abençoados geneticamente, e eles vêm em todas formas e tamanhos. Eles são você depois de anos de treinos de movimentação, e não de exercícios.



Então, quais são os componentes chave para a saúde do movimento? Aqui está meu top-3:


  1. Adaptação: paradigmas ou ambientes de treinos repetitivos criam alienação, danos por excesso de uso e capacidade limitada. Varie sua rotina de treinos e seus padrões de movimentação, e explore seus ambientes ao máximo. Grunhir e se esforçar por repetições infinitas de exercícios isolados e inúteis pode queimar gordura e  fazer seus músculos ficarem maiores, mas não fará de você o verdadeiro "movimentador" que você deveria ser. Misture, brinque, explore, quando um desafio de movimentação o cansar, comece a trabalhar em algum outro para deixar seu corpo se recuperar. Não existem "dias de braços" ou "dias de pernas", existem apenas dias do corpo inteiro. Deixe tudo mais forte e mais móvel em equilíbrio com todo o resto.
  2. Mover-se holisticamente: evite desconstruir demais seu movimento. Vou dizer novamente: movimento é mais do que a soma das suas partes. Se você reduzir seus padrões para sequências lineares e fechadas, adivinhe só - será apenas com isso que você conseguirá lidar. Direcione seu pensamento para o intuito de encontrar desafios de movimentação que sejam peculiares, tecnicamente desafiadores, e requiram que o corpo pense para conseguir resolver o problema. Encontre desafios de movimentos únicos treinando ao ar livre em estruturas que não foram planejadas com esse propósito, e as micro-variações que vão surgir em uma habilidade regular lhe farão um bem imenso.
  3. Treinamento orientado a tarefas: seus movimentos diários devem incluir desafios reais, e com isso eu quero dizer que eles precisam ser tarefas que você não tem certeza de que vai conquistar na primeira tentativa. Eles devem ser difíceis o bastante para que, para superá-los, você tenha que engajar todo o seu sistema: mente, corpo e espírito. Não tenha medo de se pressionar dessa forma; a maioria dos ganhos são feitos naquela pequena área no limite das suas capacidades, onde o sucesso e o fracasso interagem. Isso significa uma boa mistura de dificuldade técnica, física e mental. Isso vai exigir que o seu consciente relaxe um pouco e deixe suas habilidades inconscientes - suas capacidades atléticas e animalísticas naturais - venham à tona para ajudá-lo a ter sucesso. E elas virão. Elas se escondem em todos nós, logo abaixo das nossas superfícies programadas em excesso e desconstruídas.
Eu não acho que dominar nossa movimentação seja a coisa mais difícil do mundo. Ela simplesmente requer que usemos nossos corpos da forma que eles podem e deveriam ser usados. Isso, de um ponto de vista evolucionário, significa cruzar terrenos e superar obstáculos regularmente. O que é realmente suspreendente é que todos temos esse potencial, e mais de dez anos treinando e ensinando Parkour removeram da minha mente a menor dúvida de que qualquer um com vontade o suficiente pode alcançar essas incríveis técnicas e habilidades de movimentação. A comunidade do Parkour continua a crescer cada vez mais, com os adolescentes de hoje superando com facilidade os movimentos mais difíceis de apenas dez anos atrás. Eu penso que é porque o Parkour revela nosso verdadeiro potencial holístico como seres humanos. E vai continuar indo a alturas mais altas.

Então não vamos tentar fazer exercícios como máquinas, ou nem mesmo nos mover como animais - vamos nos mover como seres humanos e dar o próximo passo.

Dan Edwardes

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 2

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Victor Silva (Kratos)

A parte anterior do livro encontra-se aqui.
A parte seguinte do livro encontra-se aqui.
O índice com todas as partes do livro encontra-se aqui.



Introdução

Por que este livro?


Eu não posso falar sobre Parkour sem falar sobre o meu pai. Eles estão indeletavelmente ligados. Raymond Belle é o alicerce de tudo - da minha vida, da criação do Parkour e seu desenvolvimento mundo afora. Sem ele, não haveria David Belle e nem Parkour. Este livro não é apenas um tributo a ele, mas também uma explicação do que ele passou para mim, toda a filosofia de vida que estava no núcleo desta disciplina e continua me guiando até hoje.

O objetivo deste livro não é dar lições ou, menos ainda, me promover. Eu só quero que as pessoas entendam o Parkour como ele deveria ser. Para muitos, nós somos apenas "os caras saltando de telhado em telhado", enquanto que esta disciplina é muito mais do que isso. Se nós pulamos de um prédio para outro, é apenas porque as cidades foram construídas; se estivessemos vivendo em árvores, nós simplesmente pularíamos de árvore em árvore, nossas casas seriam pedras e nós pularíamos de pedra em pedra. Não importa onde você esteja, não importa o seu ambiente, Parkour é ir aonde seu corpo pode te levar, aonde a sua força de vontade te conduzir. Além do método de treinamento físico, além da disciplina do movimento e de cruzar obstáculos, Parkour é uma abertura para um mundo novo em folha, uma forma de aprender a se conhecer melhor, um novo modo de vida. Hoje eu posso ver que muitas pessoas não entenderam essa busca pela própria identidade, essa busca pelo próprio "eu", que o Parkour é. Não é sobre pular obstáculos para se tornar o melhor, ou se machucar e correr riscos para provar que você existe. Mesmo se no início havia um pouco disso em mim, eu logo aprendi que o excesso era inútil. Meu pai costumava dizer: "Não ative coisas negativas, não tente se machucar; a vida te dará oportunidades o bastante para aprender sobre dor e sofrimento." Eu acabei entendendo que eu não precisava passar pelo que meu pai passou para ser um homem respeitável. E muito naturalmente eu respeito as outras pessoas, mesmo se elas não conseguem fazer metade do que eu faço no Parkour. Ser um homem não é ser o mais forte, o mais durão, o que pula mais alto ou mais longe. Meu pai sempre pôs muita ênfase nisto: "Ser um homem é, acima de tudo, honrar a própria palavra. Se você disser que fará algo, então faça. Até mesmo as coisas mais servis." Um homem pode ser o mais forte do mundo, mas se ele não cumprir a sua palavra, as pessoas ao seu redor vão acabar percebendo isso e perdendo toda e qualquer forma de respeito para com ele. Os jovens têm uma grande dificuldade com isso hoje: cumprir a própria palavra. Eles prometem coisas, eles gostam de se gabar, de se mostrar, mas são apenas palavras vazias. Quando chega a hora de transformar palavras em ações, eles simplesmente somem.

Alguns traceurs* reinvidicam a criação do Parkour como se eles tivessem feito tudo sozinhos. Mas quando estão sendo entrevistados, eles são incapazes de explicar esta disciplina, de expressar seu verdadeiro significado. Mas houve a história do meu pai e de tudo que ele me deu. Eu também poderia ter dito que eu criei essa nova disciplina sozinho, eu poderia ter dito todo tipo de porcaria, eu poderia ter mentido e colocado um rótulo em mim mesmo: David Belle, Inventor do Parkour. Mas não, eu não fiz isso. Meu pai passou por coisas terríveis e o sofrimento dele me trouxe aonde estou hoje. Eu devo a ele esse respeito, essa gratidão. Depois de anos demais que eu passei sem falar sobre esse assunto realmente pessoal, eu decidi contar a história do meu pai e a verdadeira origem do Parkour. Eu quero falar disso para todo mundo que estiver interessado no Parkour ou que gostaria de começar a praticá-lo, para todos os jovens que têm tantas perguntas sobre tantas coisas e não têm necessariamente seus pais ao lado para ajudá-los, ou que se sentem perdidos como eu me senti quando era um adolescente.

É claro que a história do meu pai não é uma referência absoluta - longe disso - e ele também não é o exemplo definitivo a se seguir. Mas os jovens podem olhar ao redor de si, na própria família, e deve haver alguém, um modelo, que eles possam seguir. Alguém verdadeiro, com valores reais, que pode conduzi-los pela vida. Todos conhecemos alguém entre nossos parentes que passou por coisas extraordinárias na vida e que pode nos ensinar a permanecer autênticos e a levar uma vida de bem. Meu pai me alertou sobre as armadilhas da vida e me protegeu de pessoas negativas. Se eu tivesse prestado atenção a cada vez que me disseram "Ei, garoto, não suba esse muro!", eu nunca teria me tornado quem eu sou hoje.

Raymond Belle foi meu pai mas também foi meu mentor. Provavelmente seriam necessários dez livros para falar de toda a sua vida. Eu nunca terei tanta experiência e carisma quanto ele, mas ao menos eu tenho orgulho de contar a sua história aqui, e passar todas as coisas que ele me passou, palavra por palavra, sem acrescentar nem omitir nada.

*traceur: praticante de Parkour



sexta-feira, 19 de fevereiro de 2016

David Belle's Parkour (tradução) - Pt 1

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle
Tradutor desta parte: Victor Silva (Kratos)

A parte seguinte do livro encontra-se aqui.
O índice com todas as partes do livro encontra-se aqui.



Prefácio (por Luc Besson*)

*Diretor de B13 - 13º Distrito

À primeira vista, ninguém é mais pé no chão e enraizado do que David. Exceto, talvez, uma árvore. Precisão, concisão de palavras e de sentimentos. Cada frase é cuidadosamente pensada e precisamente direcionada antes de ser dita. Nada é deixado ao acaso. Ele mede cada palavra como se fosse se pendurar nela, como uma barra de aço ou um beiral de concreto.

Ele precisa dessa confiança para se expressar, para avançar... para voar.

Uma vez que todos os dados dos quais ele depende estão listados na sua mente, ele te segue para qualquer lugar. Sua confiança é absoluta. Em você. Nele mesmo. Nos elementos. Mas a característica mais impressionante deste jovem homem de raízes tão profundas no seu ambiente é quando ele deixa o mundo pedestre para trás.

Observá-lo flertar com a gravidade é algo totalmente incrível. Ele brinca com o vazio, pincela o concreto, voa com o vento. Ele pode criar tantas estórias no ar quanto uma dançarina de bailé no piso de um salão de ópera.

Eu senti o mesmo tipo de liberdade ao praticar scuba diving, onde a não-gravidade permite que você mergulhe de cabeça em abismos subaquáticos e faça uma curva na ponta dos dedos.

O treinamento de David frequentemente é longo, e ninguém sabe ao certo o que se passa em sua mente. Mas quando ele está pronto, a ação começa e é pura elegância, brincando com tudo, incluindo nossa visão. Na sala de edição, houveram cenas que eu tive que assistir várias vezes em câmera lenta para entender como ele havia conseguido fazê-las.

David chegou a um domínio tão completo, não somente de si mesmo mas também dos elementos ao seu redor, que às vezes ele é difícil de se alcançar. Para ele, tudo parece banal e inútil. E ele relutantemente faz com que você meça cada uma das suas próprias palavras e ações também. Seu coração dispara quando você tem dizer a ele "Você pode confiar em mim", porque você sabe que não pode decepcioná-lo.

Talvez por isso é mais fácil ele confiar em uma beira de concreto do que em um ser humano. O concreto nunca o traiu. A confiança dele é uma grande honra, e eu espero tê-la merecido.

Nós nos encontramos pela primeira vez há alguns anos. Na época, minha equipe e eu tínhamos nos deparado com o grupo Yamakasi e estávamos preparando um filme com eles. Mas surgiu um problema: ambos os nomes Yamakasi e Parkour haviam sido registrados por um oitavo homem. Eu entendi que esse oitavo homem originalmente tinha sido parte do grupo mas que ele havia tentado a sua própria sorte - sozinho - nos EUA, alguns meses antes.

Eu sugeri reintegrar o oitavo homem ao grupo, mas todos recusaram. Aparentemente, eles estavam furiosos por ele ter deixado o grupo. Ressentimento. Vingança. Nada fora do comum. Mas na verdade - como eu entendi mais tarde enquanto assistia a vídeos desse oitavo homem -, ele era muito melhor e mais forte do que eles. O nome dela era David Belle.

Então organizamos uma reunião entre os Yamakasi, David, os produtores do filme e eu.

David não disse uma palavra e deixou que seu representante falasse por ele. Enquanto isso, os Yamakasi tagarelavam como um bando de galinhas brigando por um ovo.

No fim dessa reunião barulhenta, eu fiz uma proposta simples para David: "David, deixe que eles façam esse filme conosco e, depois, eu farei um filme com você, sozinho. Você tem a minha palavra!"

Ele olhou para mim por um segundo e disse: "Ok." Até então, nós só conhecíamos um ao outro há cerca de uma hora. Ele rapidamente deixou a sala e eu só o ouvi novamente quando o apresentei para Cyril Raffaelli e o projeto B13 - 13º Distrito. Nesse dia, ele me deu seu primeiro sorriso.

Em um mundo que se deteriora, onde banqueiros movem bilhões brincando com a sorte, onde toda a política é apenas mídia, onde suborno, consumo de drogas e traições acontecem mais rápido do que as leis que lutam contra isso tudo, onde o próprio planeta está sendo esgotado pela nossa falsidade, é bom manter alguns pontos de referência.

David é um desses pontos. Ele é um herói moderno, que cresceu entre paredes de concreto e está traçando um novo rumo para nós, o rumo do qual nunca deveríamos ter nos desviado: o rumo da dignidade humana.

Luc Besson

David Belle's Parkour (tradução) - Índice

Tradução livre da versão em inglês do livro Parkour, de David Belle

Essa obra é a transcrição de uma entrevista feita com David pelo entrevistador Sabine Gros La Faige.

O livro ainda está em processo de tradução. Cada parte que for traduzida será incluída nesse índice conforme for finalizada.

Epígrafe

"Se dois caminhos se abrirem diante de você, escolha sempre o mais difícil."

Prefácio

Parte 1

Introdução

Parte 2

Meu pai, o herói

Parte 3
Parte 4
Parte 5


O início

Parte 6
Parte 7
Parte 8
Parte 9

 

Aprendizado e Treinamento


Parte 10
Parte 11
Parte 12



terça-feira, 16 de fevereiro de 2016

Movimento é música: Como fazer seu Parkour fluir

Tradução livre do artigo Movement Is Music: How To Make Your Parkour Flow, de Ben Musholt
Traduzido por: Victor Silva (Kratos)


Então, agora você já se sente confortável com saltos de precisão, passadas, e técnicas básicas de equilíbrio. Seu rolamento está firme e não causa dores. Você consegue transpor obstáculos de altura média com confiança. E você está começando a subir paredes altas com velocidade.

Parabéns! Agora você está pronto para começar a encaixar tudo isso para a parte divertida do seu treino. Uma vez que você tem um comando básico dos movimentos comuns do Parkour, é hora de começar a exercitá-los em sequência.

Pense em movimento como música


Nas artes do movimento, como artes marciais e dança, a introdução a sequências de movimentos pode ser vista do modo como músicos aprendem a fazer música partindo de notas básicas. Quando uma flautista entende como criar os tons desejados manipulando a flauta com sopro e com os dedos, ela pode passar a ligar notas em sequência e criar frases musicais. O que começa em pedaços acaba se combinando e harmonizando. Ficando competente em frases musicais, ela ganha a habilidade de encaixá-las em uma bela música.

Os instrutores da APEX Movement, Ryan Ford e Amos Rendao, levam a metáfora movimento-como-música um passo além para dizer que à medida que suas técnicas de Parkour melhoram, você pode começar a improvisar sequências de movimentos, da mesma forma que um músico de Jazz cria música no exato momento em que está tocando.

Hora de criar sua música


Então, isso é o que você vai começar a fazer nesta fase do seu treino de Parkour. Pegue algumas das técnicas que você aprendeu e as junte em um fluxo (flow) de movimento.

No nível mais básico, comece conectando dois movimentos similares, como duas variações de transposições (vaults). Encontre um par de obstáculos que estão afastados por uma distância apropriada para que você transponha um deles, dê alguns passos e então transponha o outro. Comece apenas fazendo um step/safety vault iniciando com seu pé esquerdo e então alternando para iniciar com o lado oposto no segundo vault.

Repita essa sequência dúzias de vezes, se não centenas, até os movimentos fluírem com hesitação mínima. Lute para eliminar passos extras entre os dois obstáculos, e deixe seu subconsciente guiar seu corpo.

Depois disso, comece a misturar dois tipos de movimentos. Você consegue fazer a transição de um vault para um rolamento de forma suave? Que tal passar de um vault para um salto de precisão? Seja criativo e treine todas variações de dois movimentos em que você conseguir pensar: salto de precisão para rolamento, passada para vault, vault para escalada. Você entendeu a ideia.

Crie uma música completa, não somente uma frase


Para uma segunda fase de exercícios de sequências, comece a ligar três, quatro, cinco técnicas, criando flows mais extensos. Crie uma corrida através de uma série de obstáculos que demande uma variedade de movimentos. Você consegue se balançar pelos braços e cair numa aterrisagem de salto de precisão, ligando isso a algumas passadas e então transpor algum obstáculo, tudo isso sem tropeçar nos próprios pés? Se você se sentir desajeitado e atrapalhado no início, repita a corrida de novo e de novo até que ela comece a fluir melhor.

Repetição é um ponto chave neste ponto do seu treino. Treine os movimentos e sequências repetidamente, focando-se em tornar seus movimentos cada vez mais eficientes. Alcance a perfeição através da eliminação. Trabalhe para eliminar quaisquer passos extras. Livre-se de movimentos corporais desnecessários. Pare de oscilar seus braços. Mantenha o peito para cima preste atenção à sua postura.

De forma análoga, como está sua respiração conforme você se move através das sequências de técnicas? Você está prendendo a respiração? Está ficando sem fôlego e arfando? Tente regular sua respiração junto com seus movimentos para conseguir mais vigor na série de obstáculos.

Conclusão: Preste atenção e esteja tão presente quanto possível durante as sequências que você começar a treinar. Claro que você quer que seus movimentos fluam como água, mas ao mesmo tempo você quer ser muito intencional no que está fazendo.

Ao invés de se atirar em uma série de movimentos e terminar a corrida com força bruta, esforce-se para ligar os movimentos com toda a suavidade que conseguir. Veja a si mesmo como um dançarino, interagindo com o ambiente com virtuosidade e elegância. Seja o músico, deixando as notas fluírem em uma melodia suave.

O jogo Add-on (o jogo da adição)


"Add-on" é um jogo que você pode jogar com um parceiro para treinar sequências de movimentos. Esse é um jogo bem conhecido pelos atletas criativos - ginastas, skatistas, e até mesmo snowboarders. O valor chave é que o jogo o ajuda a sair da sua rigidez e deixa o movimento se desdobrar em sequências naturais.

Como jogar Add-on

  • Encontre um ou mais obstáculos que sejam confortáveis de transpor para você e um amigo. Uma pedra grande, um tronco de árvore, um corrimão longo - praticamente qualquer coisa vai bastar para que vocês comecem.
  • Escolha uma pessoa para começar. Esse indivíduo deve executar uma técnica de Parkour com o obstáculo. Pulá-lo, transpô-lo, subir ou quicar nele, não importa.
  • Então, a segunda pessoa imita a primeira, executando exatamente o mesmo movimento, mas adiciona um movimento novo no final. Se o primeiro movimento foi um vault, a segunda pessoa pode fazer o vault no obstáculo e então seguir com um rolamento, ou uma passada, etc.
  • Após a segunda pessoa adicionar seu movimento, a primeira pessoa começa do início, fazendo o movimento inicial, a adição da segunda pessoa, e então contrubuindo com uma terceira nova técnica. 

A partir daí, você pode imaginar como o jogo se desenrola. Cada jogador executa a última sequência de movimentos e adiciona uma nova técnica, de modo que vocês acabem criando uma sequência de movimentos únicos encaixados. Acaba quando alguém não conseguir completar a última sequência executada.

Um exemplo do jogo Add-on:



Ben Musholt